domingo, maio 08, 2005

Infância


Mais uma manhã de domingo. Sol forte, céu de um azul vivo. Nenhuma nuvem. Bom para um bronzeado. Numa cadeira, olhando fascinada para o céu, ativa-se uma espécie de saudosismo adormecido há tempos, bem lá num cantinho da memória. E aí, vêm lembranças duma infância sem brinquedos de última geração tecnológica ou virtual. Televisão, por pouco tempo. Alguns raríssimos filmes ou seriados vespertinos. Quando se preferia a molecagem e traquinices ao ar livre em que todos sabiam quem era quem e onde cada um morava. Lembranças de uma infância que não existe mais.
E quantas lembranças... Das dunas brancas e morros de areias coloridas e seu labirinto na praia de Tibau durante as tão sonhadas férias escolares. A alegria da liberdade dentro do mar sobre pranchas de isopor ou bóias de câmaras de ar que os pais providenciavam com bastante antecedência, pelas oficinas da cidade, sobre as quais sentia-se o prazer quase dominante daquele mar sem fim; os castelos de areia construídos engenhosamente, para ver qual o maior e o que não caía no meio da sagrada obra; as buscas quase constantes de búzios diferentes ou da mesma cor, levados, no final das contas, pra secar no terraço de casa e, depois, devolvidos à natureza ou guardados nos baldinhos mais velhos às vezes até o próximo veraneio; das noites iluminadas pelas lamparinas e lâmpadas a gás quando participavam do convívio familiar todas aquelas sombras com seus malabarismos pelas paredes e telhados; a brisa do mar, num canto místico constante, fazia com que, no despertar do dia seguinte, estivesse todo o piso cheio de areia que vinha bailando pelo telhado.
Dos amigos de infância com os quais brincava - saindo escondida quando não deixavam - e brigava livremente pelas ruas, vielas, becos, praças e quintais: Ceição, Helana e Lenira, Íris e Astrid, Nelsinho... Brincadeiras verdadeiramente brincadas. Birras costumeiras entre enredos aos pais até arranhões, tapas, puxões de cabelos, beliscões e muito esbregue e chineladas. Com pouco tempo depois da choradeira, tudo voltava ao normal, sem mágoas nem ressentimentos até “ficar de mal, de sangue a fogo” novamente.
Dos jogos de queimada, tique, esconde-esconde, academia, pêra-uva-maçã, troca de revistas em quadrinhos, “bafo” com as figurinhas dos álbuns que davam prêmios, telefone sem fio.
Dos encontros da criançada nos domingos como este. Antes do almoço festivo pela vizinhança, em cima da grande e velha cisterna que ficava ao lado da cajaraneira no quintal de Seu Luís e Dona Neusa, fazia-se “cozinhadinhos” nas panelas e marmitas de alumínio com porções mínimas de alimentos surrupiados das cozinhas e geladeiras das casas de cada um. O fogo, normalmente era aceso no fogareiro de lata de óleo, de flandres, presente em quase toda residência. Ria-se muito quando as mães, atarefadas com a rotina do almoço dominical, davam por falta de algum utensílio. Mesmo debaixo de muita zoada como conseqüência das danações, tudo dava certo. E os travessos entreolhavam-se com a cumplicidade gostosa daquela infância, até para comprovar a eficiência da traquinagem e astúcia de cada um. Principalmente porque domingo, não era dia de castigos. Só de carão, no máximo. Os convidados de honra para os lautos banquetes infantis dominicais eram os meninos da redondeza: experts no jogo de futebol - menina não podia jogar, era coisa de homem, ô! -, no de botão, no de bola de gude (bila), em empinar pipa (papagaio), em correr nos seus carrinhos de rolimã artesanalmente fabricados nas “oficinas” improvisadas em seus quintais, davam a honra de aceitar brincar.
Estes mesmos eram os que formavam outras platéias para as meninas, a platéia para os desfiles de modas com as bonecas e suas roupas confeccionadas com retalhos de tecidos que as avós, mães, tias, madrinhas ou vizinhas não aproveitariam mais. Sempre tinha alguma parenta ou amiga que havia cursado “Corte e Costura”. Guardavam seus apetrechos na máquina Singer, Vigorelli ou Elgin. Linha e agulha sabem-se lá o trabalho que dava pra conseguir com elas! Quando não dava pra ter acesso ao estojo de costura, apelava-se para recortes das velhas revistas de moda. Mas, fazia-se a roupinha. Detalhadamente. Cada uma com criatividade e arte dignas de qualquer estilista de hoje e apresentava-se a brincadeira do desfile das bonecas.
Havia, também, mais uma brincadeira especial: o aniversário das bonecas. Cada uma, como gente grande, tinha sua data. E ia-se para a cozinha, atazanar a dona do pedaço - a cozinheira. Podia ser Teté, Nhá Rita, Salete, Dôrinha, Maria, Nenê... Quituteira de primeira, criativa, fiel, honesta e zelosa no seu ofício - sim, naquela época existia essa espécie - quase sempre atendia de bom grado aos pedidos. Quando não atendida de pronto, a “mãe” da boneca ficava, discretamente, numa estressante cantinela de argumentos e lengalengas até vencer pelo cansaço a dedicada colaboradora da família. E tinha-se o bolo em miniatura, assado numa das panelinhas daquela marmita de alumínio usada nos famosos “cozinhadinhos”, porque bolo grande, na fôrma de tamanho e formato preferido da dona da casa, somente em aniversários de verdade. Não nos de brincadeira. Refrescos ou Ki-Suco de uva. Mas, se tivesse em casa e desse sorte com a aprovação dos pais, podia ser servido Crush, Grapette ou Fanta. Um copinho que fosse. Depois, era sair convidando a meninada toda e lembrando para levar presente.
Aniversário na infância daquele tempo sempre foi sinônimo de presente. Principalmente quando era de boneca. Podia ser qualquer coisa: um vestido de outra boneca, um penduricalho qualquer que estivesse no monte de brinquedos, uma panelinha ou cadeirinha da casinha de bonecas...Mas, tinha que dá presente. E, quando chegava a hora da festa, tudo era alegria. Sentados em mesinhas baixas que normalmente eram usadas durante as refeições rotineiras das crianças da casa ou mesmo no chão, tudo transcorria maravilhosamente bem. Depois de abrir os presentes, cantar parabéns e comer do tão esperado bolo, esparramava-se em brincadeiras pelas calçadas ou jardins da casa.
E, assim, vivia-se uma infância boa!

Maria Bessa

2 comentários:

Anônimo disse...

cesar... tu eh phoda...
tens q escrever mais magrão, serio mesmo! curti muito ler teu blog, tanto q se amanhe eu tiver sobrio vou ler denovo.

Anônimo disse...

ridiculo ¬¬